Permita-se

Amanhã é aniversário da babá lesada. E aqui no condomínio tem uma loja de presentes que eu por motivos óbvios nunca mais fui porque Lorenzo tá sempre nas “minhas ilhargas”, e eu prefiro dormir na pia chupando lâmpada quente do que ele descobrir que nessa loja vende carrinhos e coisinhas que ele vai passar 24 horas me atazanando pra comprar.

Eis que hoje ele foi pra aula e eu resolvi dar um pulinho furtivamente na loja, comprar logo a lembrancinha da minha santa ajudante. Botei meu melhor shortinho – ou seja, o que coube – e fui andando, é perto, umas 5 quadras.

Aí quando eu chego lá tem um aviso que não sei porque cargas d’agua o troço não abre as quartas, é bem eu mesmo levar portada na cara.

Dando meia volta…cabrum…começa a chuviscar.

E as pessoas ditas “normais” correram pra se abrigar, porque aqui na Amazônia não tem como apressar o passo, dá um trovão e desaba aguaceiro, balas de canhão, pedradas…é sério a chuva é forte que chega a doer, e toda santa tarde.

Eu continuei andando, tava tão forte que eu ia meio curvada, mas notei que onde eu passava, nas casas,  as pessoas me olhavam constrangidas, e quando eu dei por mim eu percebi que EU também tava constragida. Se eu pudesse colocaria uma placa no pescoço “Não sou boba, é que fui comprar um presente e…”

“Olha só, tamanha velhaca de 34 anos tomando banho de chuva que nem uma adolescente boba” – pensavam elas

“Olha eu, tamanha velhaca de 34 anos tomando banho de chuva que nem uma adolescente boba” – pensava eu.

Até que …”Céus, por que eu tô cabisbaixa? Por que eu tô com vergonha?”

Quem criou essa regra que uma mulher adulta, phena, magra, alta e loira não pode tomar um banho de chuva, simplesmente porque quer?

Onde tá escrito? No Estatuto da Criança e do Adolescente? “É reservado á criança e ao adolescente fazer uso da maravilha de uma bela chuvarada num dia morno “. Tem isso?

Não tem. E levantei a cabeça, e saltitei, e sorri sozinha, e as três quadras seguintes foi de relembrar o tempo que eu não precisava de desculpas pra encarar um chuvão só pelo prazer de sentir a água escorrer pelo cabelo, entrar na boca, tapar a visão.

Se eu tivesse uma bola, eu teria brincado. Se eu soubesse fazer barquinho de papel (e andasse com um no bolso) eu colocaria nas valetas. Se o Lorenzo tivesse em casa eu ia chama-lo pra gente dançar na chuva, sem ligar se ia rolar febrão.

Anotação mental: Tomar banho de chuva uma vez por mês, pelo menos até o fim dos meus dias.